Roberto Dinamite tem fim melancólico de mandato

“Dinamite neles, Roberto… e o gooolllll”. De todos os bordões criados pelo locutor Januário de Oliveira, este foi o mais repetido. Maior artilheiro da história do Vasco e do Campeonato Brasileiro, com 705 e 190 gols, respectivamente, Roberto Dinamite não dava conta de tantas mãos que tentavam cumprimentá-lo, como na célebre foto que rendeu o prêmio Esso de 1977 para Ronald Theobald. Cercado de fás ao longo da vida esportiva, atravessou o túnel do tempo até cair no vazio como dirigente. Ao se dirigir ao local de votação na terça-feira em São Januário, o presidente foi ignorado pelos candidatos à sua sucessão.

Mesmo com o fim melancólico de governo, Dinamite conserva o potencial explosivo a julgar pelo clarão que se formou à sua volta. Depois que a fantasia do herói foi rasgada pelos limites do homem e da política, ninguém mais quer ficar perto do presidente, que amargou dois rebaixamentos em seis anos. O primeiro, quatro meses depois de Roberto assumir o cargo, em julho de 2008, foi dividido com a gestão anterior, tanto pela situação crítica em que o clube se encontrava quanto pela boa vontade de público e crítica com o ídolo.

No cenário fabuloso que transformou a queda de Eurico Miranda numa luta do bem contra o mal, Roberto era celebrado como o anjo que levaria o clube para o caminho da ética e da prosperidade. Em sua posse, foi abraçado por Sérgio Cabral, João Havelange e Márcio Braga, respectivos governador, presidente de honra da Fifa e presidente do Flamengo

 
 
 
Por mais que o time estivesse em 9º lugar no Brasileiro quando Roberto assumiu, os pecados de seus primeiros meses ainda foram relevados quando o Vasco acabou a competição em 18º. O ídolo maior já era vítima desde que Eurico expulsou ele e seu filho das tribunas de São Januário. No lugar do debate e da boa convivência de contrários, o clube reeditava o velho enredo personalista. Empurrado por todas as forças, Roberto era uma alegoria de si mesmo: jamais havia andado pelas próprias pernas na administração esportiva, mas era celebrado como o eterno craque da virada vascaína. A lupa usada para vasculhar o vilão, com o rigor a que todo homem público deve estar submetido, perdia o foco na hora de esquadrinhar o mocinho.
 
As ilusões não resistiram à vida real. Logo no início da primeira gestão, um dos seus principais apoiadores, José Henrique Coelho deixou o governo alegando que Roberto repetia velhas práticas, nomeando parentes e dando ingresso à torcida. A voz dissonante não diminuiu coro que apoiou o clube na conquista da Série B em 2009. Mesmo com tudo a favor, foi difícil encontrar a rota do saneamento já que o Vasco insistiu em celebrar grandes contratos com estatais embora suas dívidas com a união o impedissem de receber dinheiro público.
 
Ao luta pelo desbloqueio de receitas não impediu o futebol de faturar alto, com a conquista da Copa do Brasil e do vice-campeonato Brasileiro em 2011, que avalizaram o segundo mandato. Financiando por boa relação com o mercado, o Vasco juntou forças que começaram a se dissipar quando Diego Souza mandou para fora a chance do gol contra o Corinthians que levaria o time a semifinal da Libertadores. Depois de se manter por 51 rodadas na zona de classificação do Brasileiro, o time, já em processo de desmanche, terminou a edição de 2012 na quinta colocação. Com o elenco e as finanças cada vez mais combalidos, veio a recaída.
 
RESGATADO POR EURICO EM 1980
 
Roberto virou figura contagiosa mo processo eleitoral. A recusa dos candidatos em lhe cumprimentar reforça a relação de idas e vindas entre o ídolo e o clube. Resgatado do Barcelona, por Eurico, em 1980, quando estava prestes a assinar com o Flamengo, voltou para fazer cinco gols no mesmo Corinthians que encerrou o melhor momento de sua gestão. Apesar da ligação indissociável com o Vasco, Roberto vagou pela Portuguesa e pelo Campo Grande antes de encerrar a carreira em casa. Entre a acolhida e o desprezo, seu isolamento nas eleições mostra que o clube anda em círculos para voltar ao mesmo lugar em que a busca por heróis ou vilões impedem que a democracia amadureça.
 
Embora Roberto seja responsável pelas suas decisões, todo o vascaíno ou simpatizante, que apostou nele, pode ser visto como co-autor desse roteiro quase infantil. Depois de tudo que fez em campo, o ex-craque ainda era visto como um dirigente preparado para salvar a instituição. Se a visão romântica negligenciou seu preparo para o cargo, Roberto mostrou rara capacidade para reabilitar Eurico. Assim como a idolatria não pode dar imunidade ao dirigente, o desencanto com o homem não deve afetar o ídolo. Ao menos nos gols eternizados por Januário, todos os vascaínos ainda estendem e mão e correm para abraçar Roberto.
 
Fonte: O Globo
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